CRIANÇAS ESPECIAIS?

Ethel Rosenfeld*


 

     

Adaptação de Ethel Rosenfeld de um texto de Celina B. M. Campos.
Ambas são professoras especializadas em educação e reabilitação de pessoas com deficiência visual.

Todas as crianças são muito especiais, mas algumas precisam de um apoio, de um olhar, de um saber diferenciado do adulto. É sobre estas crianças que o Trocando em Miúdos quer chamar sua atenção. Além do que vamos conversar, queremos sugerir outras fontes de informação com as quais a equipe do Centro de Educação Infantil (Cei) poderá entrar em contato e tirar dúvidas, se for preciso. Mesmo a distância, especialistas em educação e reabilitação de portadores de alguma deficiência podem dar
informações preciosas e sugerir como desenvolver um trabalho pedagógico de inclusão dessas crianças.

Para começar, a criança com alguma deficiência, seja ela da área motora (dificuldade ou impossibilidade de andar, ou de segurar um objeto, por exemplo) da área da percepção (dificuldade de ouvir ou de ver) ou intelectiva (defasagem, por alguma razão, em relação ao seus companheiros da mesma idade) tem problemas que outras não têm. Como ela não possui todos os instrumentos necessários para o processo de aprendizagem que gera um desenvolvimento normal, a sua interação com as pessoas
com quem convive fica prejudicada. É preciso dar-se conta desta realidade e agir para ajudar a criança, estimulando-a a superar os obstáculos que ela enfrenta a toda hora. Uma grande sensibilidade é necessária para saber como ajudá-la na medida justa, e não mais do que isto, para que a criança experimente a sensação insubstituível de vitória pessoal, por ter resolvido por seu próprio esforço uma situação que para ela representava um difícil problema. A ajuda excessiva, querendo proteger a
criança portadora de deficiência das dificuldades que ela deve enfrentar, somente fará com que sua independência seja retardada.

A importância do atendimento precoce e o papel do Cei

Ao elaborar a ficha individual de cada criança, é importante que o Cei se preocupe em saber todos os dados referentes à gestação e ao parto. Deve-se registrar as doenças que a mãe tenha tido, como rubéola, toxoplasmose, diabetes, sífilis, ou outras. É igualmente importante saber que características como incompatibilidade sanguínea, por exemplo, podem afetar o bebê e aumentar o risco dele apresentar alguma deficiência. Mas os problemas não estão somente nas doenças. Um parto prematuro, ou muito demorado, pode provocar uma diminuição da chegada de oxigênio no cérebro, o que poderá deixar seqüelas na criança. A professora precisa saber este histórico, para que, principalmente nas turminhas de crianças até um ano, ela possa estar bem atenta ao seu comportamento. A identificação precoce de uma deficiência em uma criança, por menor que seja, e seu imediato encaminhamento a um especialista, podem fazer uma enorme diferença, que mudará decisivamente o futuro dessa criança.

Todas as crianças têm direitos. Esta afirmação inclui, naturalmente, as crianças portadoras de deficiência. Os direitos destas crianças estão garantidos pela "Política Nacional de Educação Especial", que é um conjunto de dispositivos que tratam especificamente do atendimento educacional das crianças cujo direito à igualdade de oportunidades tem de ser respeitado. 1

As pessoas portadoras de deficiência têm uma história de luta por seus direitos à vida e à felicidade. Elas sabem que foi uma vitória ter esses direitos transformados em leis. Mas existe sempre uma distância entre o que a lei determina e sua aplicação no dia-a-dia. A questão a ser respondida na prática é: como tornar esses direitos respeitados, como incluir essas crianças no grupo sem que elas se sintam marginalizadas?

A integração educativa é uma resposta possível a esta questão. Ela se refere ao processo de educar e cuidar, no mesmo grupo, de crianças com e sem necessidades educativas especiais. O que chamamos de "inclusão" é um processo, que começa quando o Cei se prepara para receber a criança portadora de deficiência. Esta preparação se dá tanto em relação ao aspecto físico do ambiente do Cei quanto em relação à sua equipe e às crianças que o freqüentam.

CONDIÇÕES NECESSÁRIAS À INCLUSÃO NO CEI

* A Sondagem do Ambiente

O ambiente em que o portador de deficiência vai ser recebido é um fator muito importante. O processo de inclusão, por suas características, aconselha que a instituição de educação infantil esteja localizada próximo à residência da criança, facilitando seu acesso e oferecendo maiores oportunidades de contato com as crianças da vizinhança e de sua comunidade. A instituição escolhida deve contar com uma equipe de educadores acolhedora e receptiva à idéia da inclusão. Isto significa que esta equipe deve estar aberta ao diálogo com a família e com os profissionais especializados que fazem o acompanhamento destas crianças.

O ambiente físico do Cei, desde que planejado para proporcionar segurança e espaço para todas as crianças, também será apropriado para o portador de deficiência.

No caso do deficiente visual, ele precisará conhecer a instituição com o auxílio do professor especializado. Vai aprender a se orientar nela, conhecer suas escadas, degraus, pontos de referência para as salas, banheiros e demais espaços que existem ali. Quando tiver apreendido onde estão essas coisas, saberá como se locomover sem necessitar do auxílio de ninguém. Para as crianças que usam cadeiras de rodas, é necessário que se planeje ou adapte o Cei para permitir seu livre acesso aos
diferentes locais, como determina a lei.

Desafios que precisam ser superados

A inclusão de uma criança portadora de deficiência numa instituição integrada pode ser vista de maneira diferente, dependendo da compreensão, da empatia, dos conhecimentos, da flexibilidade e da disposição em aprender das pessoas que a recebem. Muitas vezes, é a falta de informação, aliada a preconceitos que têm raízes profundas, que faz com que as pessoas rejeitem as crianças com necessidades especiais ou se sintam inseguras em relação a elas. Entrar em contato com uma criança portadora de deficiência
também pode trazer à tona sentimentos de piedade, de superproteção e até de culpa, devido ao trabalho extra que ela pode representar e à sensação de que não se está respondendo às suas solicitações, na medida que ela necessita.

Questões como o excesso de crianças numa turma, o acúmulo de tarefas do professor/a, o planejamento dirigido à maioria das crianças, as diferentes demandas dos serviços de orientação, supervisão e administração, muitas vezes tornam o professor/a cético/a quanto às possibilidades de adaptação desta criança especial. Até mesmo a direção da escola pode ser levada a não acreditar nas chances de adaptação do portador de deficiência à turminha.

Dar-se conta destes sentimentos é um grande desafio, tão grande quanto procurar as soluções que garantam o bem estar das crianças portadoras de deficiências e, ao mesmo tempo, assegurem os educadores de que estão agindo de forma consciente e correta em relação a elas.

* A Direção e a Equipe Técnica

A atitude da direção é fator essencial para a inclusão do portador de deficiência ao ambiente do Cei. Um diretor que seja sensível ao problema e que tenha um bom relacionamento com toda sua equipe de educadores, que tenha um bom diálogo com a família e com o professor especializado, favorecerá o trabalho de integração. Embora não tenha um contato tão direto com a criança quanto os educadores, sua atitude contagia toda a equipe. Esta ajudará a direção a indicar quem melhor saberá relacionar-se
com a criança e promover a integração à sua turma.

Um relacionamento próximo com o profissional especializado dará elementos à equipe técnica de orientação pedagógica para identificar possíveis problemas que estejam ocorrendo com a criança portadora de deficiência. Esta colaboração entre especialistas melhora sensivelmente a tarefa de encontrar soluções e recursos necessários para alcançar os objetivos comuns.

Uma pesquisa sobre deficiência realizada por Keilbaugh, em 1977, demonstrou que os professores que haviam assistido a palestras sobre educação especial ou tido contato prévio com portadores de deficiência possuíam uma atitude mais positiva em relação a eles. A pesquisa recomenda que haja maior divulgação da educação especial, da seguinte maneira:
A) Proporcionar a/o professor/a informações sobre as condições da deficiência da criança, suas características e nível de exigência de comportamentos
B) Contrapor mitos e preconceitos a fatos e esclarecimentos sobre os diferentes tipos de deficiência.
C) Oferecer e demonstrar como são, ou como funcionam materiais específicos para o atendimento da criança portadora de deficiência;
D) Ajudar a planejar o programa individual para cada portador de deficiência

Estas informações podem ser divulgadas em pequenas palestras, durante reuniões de orientação pedagógica da equipe do Cei ou em reuniões de pais, pois é importante que todos sejam sensibilizados a respeito destas questões. Elas também podem ser abordadas regularmente em boletins de informação que circulem pela comunidade. Os contatos informais com a equipe de educação especial devem ser programados para que as informações sejam constantemente atualizadas.

* O Professor

Além do envolvimento da direção, da equipe técnica e de todos os educadores no trabalho de integração, o professor que terá a criança deficiente em sua turma precisará de apoio constante, de avaliação periódica e de informação e troca de experiências para poder planejar adequadamente suas atividades.

Inicialmente o professor precisa estar plenamente consciente de que a criança portadora de deficiência tem necessidade de pensar e descrever fatos de acordo com suas próprias experiências e sensações, em vez de ser obrigada a memorizar descrições visuais de segunda mão, como lembra Cutsforth. Isto significa que a criança portadora de deficiência necessita de um ensino que esteja baseado em vivências reais.

Isto exige do/a professor/a um comportamento mais ativo, inovador e flexível. Precisa estar atento não só às necessidades de todas as crianças ditas "normais", mas também às necessidades da criança portadora de deficiência. Esta atitude certamente beneficiará também as crianças "normais" que serão igualmente estimuladas a utilizar todos os seus sentidos.

* Os coleguinhas

Há uma certa preocupação dos educadores quanto à recepção da criança deficiente pelos colegas, principalmente pelos mais velhos. Podemos assegurar que, de acordo com observações e pesquisas, não há fundamento para esta preocupação. O convívio entre crianças com deficiência e crianças ditas "normais" é saudável para ambos os lados, pois a criança deficiente precisa sentir-se aceita para superar suas dificuldades e a criança não deficiente aprenderá desde cedo a aceitar as diferenças que existem entre as pessoas. Infelizmente, muitas vezes o preconceito é passado às crianças pelos adultos. As crianças são, de maneira geral, mais receptivas às diferenças, mais sinceras e solidárias. Sabendo-se disto, é importante que se faça uma preparação das crianças, informando-as sobre alguns aspectos característicos de determinadas deficiências. Isto pode ser feito mostrando-lhes os materiais e aparelhos que vão ser usados, deixando que elas os manipulem. Algumas crianças, por livre e espontânea vontade, gostarão de experimentar, tentando realizar tarefas como se fossem portadoras de alguma deficiência, como usar cadeira de rodas, ter os olhos vendados ou os ouvidos tapados. Se partir da própria criança, este procedimento será válido. Como podem surgir perguntas sobre a deficiência, o educador
deve estar preparado para respondê-las. Ou poderá buscar, junto com as crianças, as informações que elas estão interessadas em obter.

CONCLUSÃO

Incluir uma criança portadora de deficiência envolve muitos e variados aspectos, que necessitam de constante observação e de acompanhamento cuidadoso, para o qual os educadores terão de se preparar adequadamente. Embora as crianças portadoras de deficiência provavelmente estejam em algumas turmas e em outras não, é importante que todos os educadores do Cei contribuam para a integração dessas crianças. Esse espírito de cooperação e essa compreensão incluem a participação da equipe especializada e o fundamental apoio de todos os pais. Um sistema educacional tem por objetivo preparar adultos amadurecidos que tenham atitudes realistas sobre o que podem ou não podem fazer. Mas devem ser estimulados a realizar plenamente o potencial de cada um, aproveitando todas as oportunidades que se apresentarem.

* Dicas... (a ser colocado na lateral)
* Escrever com letras grandes no quadro de giz, ou nos cartazes que ficarem na sala.
* Ampliar ilustrações de histórias para que a criança de visão subnormal consiga acompanha-las melhor.
* O professor deverá falar sempre de frente para a turma, procurando pronunciar as palavras com clareza, para que a criança portadora de deficiência auditiva também possa acompanhar as aulas.

A Professora Ethel Rosenfeld é portadora de deficiência visual. Isto não a impediu de cursar Letras brilhantemente na Faculdade. Hoje ela é professora de Português e Inglês. Sua condição a levou a prosseguir nos estudos, especializando-se em Educação e Reabilitação de Pessoas com Deficiência Visual. A Professora Ethel é, atualmente, Supervisora da Área de Deficiência Visual da Fundação Municipal Francisco de Paula - FUNLAR - da Secretaria Municipal de Desenvolvimento social - SMDS e é, também, Consultora da Área de Deficiência Visual do Centro de Vida Independente do Rio de Janeiro - CVI-Rio.

FONTES DE INFORMAÇÃO:

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCADORES DE DEFICIENTES VISUAIS - ABEDEV -
Rua Rui Barbosa, 1961 ap. 14
CEP 79.005-431
Campo Grande - MS
Tel: (67) 382 12 36
Fax: (67) 382 15 81
E-mail: abedev@starbox.com.br

COORDENADORIA PARA INTEGRAÇÃO DA PPD - CORDE
Esplanada dos Ministérios, Bloco "T", anexo II - 2o andar - sala 206
CEP 70.064-900
Brasília - DF
Tel: (61) 429 31 28
Fax: (61) 225 04 40 / 225 34 19
E-mail: corde@mj.gov.br
www.mj.gov.br/sndh/corde.htm


INSTITUTO NACIONAL DE EDUCAÇÃO DE SURDOS - INES/MEC
Rua das Laranjeiras, 232 - Laranjeiras
Rio de Janeiro - RJ
CEP 22.240-001
Tel.: (21) 2285 72 84 / 2285 75 97
FAX: (21) 2285 72 84
E-mail:DDHCT@INES.ORG.BR
WEB: WWW.INES.ORG.BR


CENTRO DE VIDA INDEPENDENTE DO RIO DE JANEIRO - CVI-Rio
Rua Marquês de São Vicente, 225
Estacionamento da PUC - LOTDP - Gávea
Rio de Janeiro - RJ
CEP 22.451-041
Tel.: (21) 2512 10 88
Fax: (21) 2239 65 47
E-mail: genogue@aol.com
WEB: www.cvi-rio.org.br


INSTITUTO BENJAMIN CONSTANT - IBC/MEC
Av. Pasteur, 350 / 368 - Urca
Rio de Janeiro - RJ
CEP 22.290-190
Tel.: (21) 2543 11 19 / 2543 11 80
Fax: (21) 2543 23 05
E-mail: ibc@ibcnet.org.br
WEB:www.ibcnet.org.br


REDE SACI - SOLIDARIEDADE, APOIO, COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO
Universidade de São Paulo - USP
Tel: (11) 38 18 44 55 / 38 18 43 70
Fax: (11) 32 11 39 42
E-mail: saci@saci.org.br
WEB: www.saci.org.br


Secretaria de Educação Especial SEESP - MEC
Esplanada dos Ministérios, bloco L 6o andar sala 606 / 600
Brasília - DF
CEP 70.047-902
Tel: (61) 410 86 51 / 410 81 88
Fax: (61) 410 92 65
E-mail: seesp@seesp.mec.gov.br
www.mec.gov.br/seesp/default.shtm


ASSOCIAÇÃO DE PARALISIA CEREBRAL DO BRASIL - APCB
Rua Álvaro Alvim, 37/33 - sala 604 - Cinelândia
Rio de Janeiro - RJ
CEP 20.031-010
Tel.: (21) 2240 38 07
Fax: (21): 2240 38 07
E-mail: apcb@openlink.com.br
WEB: www.apcb.org.br

CENTRO DE INFORMATICA E INFORMAÇÕES SOBRE PARALISIAS CEREBRAIS
Largo do Machado, 29 - sala 1101 - Catete
Rio de Janeiro - RJ
CEP 22.221-020
Tel.: (21) 2556 91 29
Fax: (21) 2285 71 45
E-mail: defnet@defnet.org.br
WEB: www.defnet.org.br

FEDERAÇÃO NACIONAL DAS APAES
SDS Edifício Venâncio IV Cobertura
Brasília - DF
CEP 70.393-900
Tel.: (61) 224 99 22
Fax: (61) 223 58 99
E-mail: fenapaes@apaebrasil.org.br
WEB: www.apaebrasil.org.br


FEDERAÇÃO NACIONAL DE EDUCAÇÃO E INTEGRAÇÃO DOS SURDOS - FENEIS
Rua Major Ávila, 379 - Tijuca
Rio de Janeiro - RJ
CEP 20.511-140
Tel. e Fax: (21) 22 84 74 62 / 25 67 48 80
E-mail: feneis@vento.com.br
WEB:www.feneis.com.br


FEDERAÇÃO NACIONAL DAS SOCIEDADES PESTALOZZI - FENASP
Rua Odílio Bacelar, 48 - Urca
Rio de Janeiro - RJ
CEP 22.290-280
Tel.: (21) 2542 29 91
Fax: (21) 2541 43 38
E-mail fenasp@ism.com.br / pestalozzi@pestalozzi.com.br
*

1 O conteúdo desta política está fundamentado na Constituição Federal de 1988, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, no Plano Decenal de Educação para Todos - MEC, no Estatuto da Criança e do Adolescente e nas Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil